Paciente que vive na UTI do HCI desde que nasceu realiza o sonho de se formar

  • 31 de dezembro de 2023
a2d83f8c-a310-48aa-8c7b-67f5386478ff

O Fantástico de 31 de dezembro mostrou a história de um jovem de 19 anos que vive em um quarto de hospital desde que nasceu, mas que termina este ano de 2023 com uma grande conquista: a tão sonhada formatura.

Jean Carlos Kittlaus conhece muito pouco da vida fora do hospital, pois desde que nasceu vive na UTI de um hospital em Ijuí, no Rio Grande do Sul. O jovem, que é um contador de histórias, transformou o quarto num mural de memória, fotos e lembranças. A mãe, Eliane Zilke, sempre esteve ao seu lado e fala como foi a trajetória do filho até aqui. “Foi uma gravidez muito planejada, uma criança desejada e amada”, diz.

Jean nasceu em uma cesariana feita às pressas, no dia 27 de dezembro de 2004. Ele nasceu com parada cardiorrespiratória, foi intubado e, após outras paradas, veio o diagnóstico de miopatia congênita mitocondrial, um distúrbio raro que diminui o tônus muscular, causa fraqueza e dificuldade nos movimentos do corpo.

Eliane conta que esse foi o pior dia de sua vida, e que o prognóstico era de que o filho não teria coordenação motora, não teria força, e que não iria caminhar, além de não poder respirar sozinho, mas que ele poderia evoluir com suporte clínico para poder ter qualidade de vida.

Por conta dessa esperança, ela conta que decidiu fazer tudo o que estivesse ao seu alcance. “A força vem dele, porque o Jean é uma criança muito especial. Ele é muito, muito querido”, diz.

O Jean precisa de muitos cuidados 24 horas por dia, por isso a UTI é o lugar mais seguro para ele viver.

“As miopatias congênitas mitocondriais aparecem menos de uma para um milhão de nascidos. A gente não sabia se esse grau de fraqueza muscular e comprometimento que ele tinha ia persistir ou se ele seria reversível baseado em estímulos e outras formas de terapias”, conta o pediatra e neonatologista Mauricio Bortolini, responsável técnico pela UTI neonatal do Hospital de Clínicas de Ijuí.

Mudança de vida familiar
Há 8 anos, a mãe de Jean fez o curso técnico de enfermagem para ajudar no dia a dia. Hoje, ela trabalha no mesmo hospital que o filho vive desde o nascimento. Ela participa de tudo e só vai para casa na hora de dormir. “As pessoas as vezes olham assim e acham que é uma história triste, não é. É uma história muito bonita”, conta.

Em conversa com o Fantástico, Jean contou quais são as qualidades que ele vê em si. “Cheiroso, bonito, gostoso, lindo, bonitão…”, conta com a ajuda da mãe na tradução, por conta da dificuldade de fala.

Superando desafios
Ele recebe estímulos e faz terapias o dia todo. Apaixonado por música, ele adora gravar vídeos para bombar nas redes. Para aprender a ler e a escrever, ele contou com a ajuda da tecnologia. Ainda criança, realizou um sonho e virou escritor.

Ele é autor do livro “As Aventuras de um Pavão Fanfarrão”. Aos 9 anos, ele recebeu a visita do cartunista e escritor Maurício de Souza, que editou e ilustrou o livro.

Para concluir os estudos, Jean precisou da ajuda, do amor, do empenho, da dedicação de muita gente. Durante três anos a professora do ensino médio foi ao hospital para dar aulas. “Ele é um menino pesquisador. Quando ele coloca uma ideia na cabeça para descobrir, referente a um assunto, ele vai atrás”, diz a professora Nadir Schuster Colling.

O currículo, o material e as provas são adaptados pelas professoras. Ele nunca foi até o colégio, mas tudo chega a ele por vídeo.

O desempenho até rendeu uma medalha nas Olimpíadas de Matemática da escola. Agora, com 19 anos, veio a formatura. Em um ano que ele saiu apenas quatro vezes da UTI, acabou dando uma “escapadinha” para comemorar. Tudo feito com a ajuda de muita gente.
Para chegar ao auditório do hospital, foi necessário oxigênio portátil e uma torcida gigante. Ao sair do elevador, profissionais e amigos batem palma para sua chegada.

Nadir, a professora, diz que o momento representa algo único na educação, motivo de esperança. “Ele nos inspira, nos motiva. O Mauricio de Souza chamou ele de menino passarinho. E realmente ele é um menino passarinho, que além de aprender a voar, ele também nos ensina e nos motiva a voar junto com ele”, fala.


Matéria publicada no G1 em 31/12/2023

error: Este conteúdo está protegido!